Atualizando o texto do Prof. José Armando
Valente, publicado nos anos 90, encontrei
uma entrevista do próprio, publicada em 2010, onde ele apresenta inúmeras
possibilidades de utilização de ferramentas tecnológicas.
Cultura digital e escola
Salto – Em várias outras ocasiões, você aponta para certo receio
dos professores em relação ao uso das tecnologias na educação. Qual é hoje o
panorama desse uso das tecnologias, e em especial das tecnologias da informação
e da comunicação, nos processos educacionais?
José Valente – Nós nos referíamos ao uso das tecnologias, principalmente dos computadores, desvinculado do que acontecia na sala de aula. Os alunos tinham basicamente aula de informática. Então, se ensinava Word, uma planilha, e tudo isso era desvinculado do que acontecia em sala de aula. Acho que isso mudou um pouco, nós não estamos mais tão vinculados a essa abordagem, embora muitas escolas ainda usem o laboratório de informática desvinculado do que acontece em sala de aula. É uma transição muito gradativa, e o professor está começando a aprender que essa tecnologia pode ser usada para desenvolver alguns assuntos relacionados ao que ele fala em sala de aula, relacionados com a disciplina. Começa-se a ter algum projeto usando tecnologia, professores complementando o que falam em sala de aula usando tecnologia, mas ainda vejo como um apêndice. Porque o controle de quem vai ao laboratório, quando se vai ao laboratório, em que circunstância se usa o laboratório, ainda é do professor. O aluno tem pouco controle desse processo. Com a possibilidade de se ter um computador para cada um, como chamamos o 'Projeto UCA' – um computador por aluno – esse aluno vai ter o computador na sua mochila, e aí eu penso que isso vai fazer uma mudança muito grande na maneira como essa tecnologia vai ser usada na sala de aula.
José Valente – Nós nos referíamos ao uso das tecnologias, principalmente dos computadores, desvinculado do que acontecia na sala de aula. Os alunos tinham basicamente aula de informática. Então, se ensinava Word, uma planilha, e tudo isso era desvinculado do que acontecia em sala de aula. Acho que isso mudou um pouco, nós não estamos mais tão vinculados a essa abordagem, embora muitas escolas ainda usem o laboratório de informática desvinculado do que acontece em sala de aula. É uma transição muito gradativa, e o professor está começando a aprender que essa tecnologia pode ser usada para desenvolver alguns assuntos relacionados ao que ele fala em sala de aula, relacionados com a disciplina. Começa-se a ter algum projeto usando tecnologia, professores complementando o que falam em sala de aula usando tecnologia, mas ainda vejo como um apêndice. Porque o controle de quem vai ao laboratório, quando se vai ao laboratório, em que circunstância se usa o laboratório, ainda é do professor. O aluno tem pouco controle desse processo. Com a possibilidade de se ter um computador para cada um, como chamamos o 'Projeto UCA' – um computador por aluno – esse aluno vai ter o computador na sua mochila, e aí eu penso que isso vai fazer uma mudança muito grande na maneira como essa tecnologia vai ser usada na sala de aula.
Salto – Como seria essa mudança? Como você vê essa mudança?
José Valente – O
professor vai ter que fazer uma adaptação muito grande naquilo que ele faz,
porque o aluno vai ter acesso a essa tecnologia na hora em que ele quiser. Ele
vai poder usar esse computador relacionado com que o professor está falando em
sala de aula. Por exemplo, eu tenho alunos hoje que trazem seu laptop para a
sala de aula, e quando estou falando determinado assunto, eles estão
conectados, e me corrigem, complementam, ou trazem uma informação nova que
estão vendo na tela. Acho que essa dinâmica, de o aluno poder estar conectado,
poder receber e acessar informações em tempo real, à medida que o professor
está tratando determinado assunto, vai fazer com que esse professor tenha que
recriar a sua prática de sala de aula, ao invés de ficar colocando informação,
por exemplo, no quadro de giz.
Salto – Qual é, em sua opinião, o lugar do computador na escola?
José Valente – A
questão da apropriação tecnológica, que é esse ponto de que estamos falando, em
diversas escalas. A 1ª escala é o professor saber ligar essa máquina, é saber
que essa máquina existe e que ela pode fazer alguma coisa diferente, por
exemplo, um processador de texto, uma planilha; o 2º é ele se apropriar dessa
tecnologia, para ele. Por exemplo, ele fazer alguma atividade utilizando a
tecnologia, como uma prova, um gráfico; o 3º nível, quando ele começa a
utilizar a tecnologia para fazer alguma coisa com os seus alunos na sua
disciplina. Acho que estamos, mais ou menos, nessa fase agora. Na fase em que o
professor começa a entender que essa tecnologia pode ser usada para desenvolver
algum trabalho, ou algum conteúdo da sua disciplina. O próximo passo é quando o
professor começa a integrar as tecnologias, não só com a sua disciplina, mas
com outras disciplinas. Começa a desenvolver projetos, começa a fazer o uso da
tecnologia não apenas vinculada à sua disciplina, mas procurando ampliar essa
disciplina. Por exemplo, usando assuntos de matemática junto com português, ou
geografia, ou meio ambiente. Ou seja, o professor começa a usar o computador
para o desenvolvimento de projetos, e a pensar num trabalho mais
transdisciplinar, cruzando um pouco as disciplinas. E o último estágio, que é
quando esse sujeito começa a usar o computador, tanto o aluno quanto o
professor, para desenvolver coisas no dia a dia, como pensamos diversas
tecnologias – por exemplo, o telefone celular – uma série de tecnologias de que
nos apropriamos, e usamos sem nem mesmo pensar a respeito dessa tecnologia. Ela
começa a fazer parte da nossa vida. Você já começa a entender que antes de sair
de casa precisa acessar a internet, ou precisa se comunicar e pensa na
internet, ou seja, ela começa a fazer parte do seu dia a dia. Então, eu acho
que estamos no estágio 3, e se conseguirmos ir para o estágio 4, acredito que
faremos uma mudança muito grande nessa abordagem tecnológica que o professor
faz, no sentido de ele começar a pensar não só na sua disciplina, mas pensar em
projetos integrando a tecnologia a outras disciplinas. Quando conseguirmos esse
estágio, o computador começa a estar integrado ao currículo, e não mais
simplesmente a ser um apêndice daquilo que se faz em sala de aula. Nesse
sentido, acho que saímos do currículo, da sala de aula do lápis e papel, para
um currículo da sala de aula digital.
Salto – Nós já fizemos várias séries em que você abordou a
importância de alguns recursos, como blog, fotolog, podcast – que são rádios
via web – fazerem parte do processo educativo. Mas esses recursos se modificam
muito rapidamente, e ganham novas funções e novos usos. Hoje nós temos o
twitter, que nada mais é do que um microblog, em que as pessoas escrevem em 140
caracteres. De que maneira esses recursos podem contribuir nestas atividades
escolares que você acabou de apontar?
José Valente – Bom,
nós estamos falando dos recursos da web 2.0, que são recursos que, em primeiro
lugar, o usuário passa a ser autor. Não é mais um receptor somente da
informação, mas ele começa a gerar informação por todos esses meios de que você
falou. Participando de um Second Life, usando o twitter, fazendo o seu blog,
fazendo uma página etc. Agora, no meu entender, são meios, são recursos que o
professor pode usar. O que gostaríamos realmente que acontecesse é que esses
recursos estivessem a serviço de um desenvolvimento curricular, ou seja, do que
acontece na disciplina em sala de aula. Então, por exemplo, o aluno vai fazer
um blog, vai tratar de um determinado assunto via blog, isso deveria estar
vinculado. O professor deveria estar trabalhando esse conteúdo, esse material,
junto com o aluno, de modo que nesse blog fosse tratado junto com outros
assuntos, porque é impossível você ficar restrito só àquele assunto que o
professor está tratando. Como eu falei antes, gostaríamos que houvesse um pouco
mais dessa interdisciplinaridade. Outra coisa que está sendo muito usada e que
é bastante permitido pela web 2.0 são as animações, o uso de imagens, o uso de
recursos de que a escola ainda não se apropriou. Porque estamos muito
vinculados à palavra, à representação linguística por palavra. Linguagem
escrita e falada, e os blogs e o twitter ainda estão muito nessa linha. O que
precisamos fazer é dar outro passo, que é a inclusão de outros recursos, como,
por exemplo, a imagem, o som, a animação. Nesse sentido, fala-se muito dos
letramentos. O letramento digital, que é a incorporação da tecnologia digital
na sua maneira de pensar e fazer; o letramento alfabético, que é o uso da
palavra escrita e falada; o letramento imagético, que seria o uso das imagens;
o letramento sonoro, o uso do som. Então, vemos ainda que estamos num princípio
muito básico do uso desses letramentos, o que vemos o professor fazendo, ou o
aluno fazendo, é um power point com aqueles sons. É um uso muito trivial do
som, um uso muito trivial da imagem. Os professores e os alunos precisam
trabalhar melhor essas questões e ter a apropriação desses diferentes recursos,
o que chamamos de letramentos. Isso significa uma mudança do currículo, que foi
feito para o lápis e papel, para um currículo da era digital. Um exemplo: no
currículo do lápis e papel, na questão da matemática, nós resolvíamos equações
do segundo grau calculando o valor de x1 e x2, na verdade onde é que a curva
corta o eixo do x. Isso é uma coisa muito trivial se você tiver os recursos de
gráficos que você pode usar no computador e você vê a curva, você não precisa
ver somente os pontos do x1 e x2, você vê a amplitude da curva, se ela abre ou
se ela fecha, se ela é côncava, se ela é para cima ou se ela é para baixo, ou
seja, o professor agora vai ter que saber o que ele faz com a curva, como é que
ele interpreta isso e não mais calcular o valor de x1 e x2, que é o que nós
fazíamos com o lápis e com o papel. Isso significa uma apropriação, um
letramento da questão imagética do gráfico, da questão da animação, em que você
vê o gráfico sendo construído, você muda os parâmetros, você vê a curva
alterando, ou seja, você tem recursos hoje para serem explorados que vão além
da questão do blog, que vão além da questão do twitter, outros recursos que são
oferecidos pela web 2.0, que nós não estamos acessando, não estamos trabalhando
ainda de modo relacionado, vinculado com o que se passa na área curricular de
uma determinada disciplina, por exemplo.
Salto – Não é incomum saber de experiências que incorporam esses
recursos, mas apenas os reproduzem, como o que era feito, até então, com o
quadro de giz. Que cuidados o professor precisa tomar para não correr esse
risco de reprodução? Você deu o exemplo de fazer um power point, que tem
imagem, escrita e som, mas não necessariamente é aquilo que a tecnologia pode
dar, pois apenas está reproduzindo o que era feito com o quadro de giz.
José Valente – Eu gosto muito de falar da questão da apropriação, e falamos sempre nos níveis. É um processo, não vai cair como um milagre. O professor não vai se apropriar disso instantaneamente. Acho que ele vai começar errando mesmo, tem que começar fazendo a coisa mais próxima do que ele faz, que é o giz e o quadro. Agora, o que ele precisa desenvolver é um espírito crítico, de modo a criticar isso, e sempre procurar um estágio mais avançado. "Como é que eu posso melhorar?". Eu também já fiz o meu power point com sons. Agora, o problema é que não podemos parar aí. Temos sempre que estar criticando, e falar: "Como é que eu posso melhorar? O que tem de novo que eu posso colocar?". E com isso vamos gradativamente mudando os estágios. Entender, por exemplo, que temos os novos recursos, que recursos podemos usar além da imagem? Eu estou usando bem a imagem? Essa imagem que estou colocando aí fala alguma coisa? Está relacionada com o assunto, ou é simplesmente um enfeite que eu coloquei para ficar bonito e não tem informação nenhuma? Porque o leitor está procurando as informações. Se eu não falo qual a relação que tem entre o assunto que estou desenvolvendo e a imagem que eu coloquei, ele fica perdido. Porque ele pode ler a imagem do jeito que quiser. Então, esse processo de entender isso, os letramentos, como estamos falando, passa por esses estágios em que utilizamos da maneira que sabemos, mas gradativamente teremos que fazer esse movimento de ir avançando, e procurando outros estágios. Isso aconteceu com toda tecnologia. Se pensarmos no cinema, por exemplo, inicialmente era como o teatro. Era o teatro filmado. Mas logo eles começaram a perceber que podiam fazer mais. E hoje temos uma indústria do cinema que é totalmente diferente da indústria do teatro. Esse mesmo processo acontece com a tecnologia. Não sou contrário ao fato de o professor fazer as coisas como ele faz, e que são muito semelhantes ao que ele fazia antes, no lápis e no papel. O que é preciso é que ele dê um salto e não fique nesse estágio. Nesse sentido, os alunos podem ajudar muito, porque eles estão vivendo, numa rapidez muito grande, esse desenvolvimento tecnológico, e estão se apropriando de uma maneira muito mais rápida do que o professor. É importante fazermos parceria com o professor, notarmos a maneira como ele está usando a tecnologia, e aí incorporar isso nas nossas práticas. E, gradativamente, ir mudando nesses estágios, nesses processos de apropriação.
José Valente – Eu gosto muito de falar da questão da apropriação, e falamos sempre nos níveis. É um processo, não vai cair como um milagre. O professor não vai se apropriar disso instantaneamente. Acho que ele vai começar errando mesmo, tem que começar fazendo a coisa mais próxima do que ele faz, que é o giz e o quadro. Agora, o que ele precisa desenvolver é um espírito crítico, de modo a criticar isso, e sempre procurar um estágio mais avançado. "Como é que eu posso melhorar?". Eu também já fiz o meu power point com sons. Agora, o problema é que não podemos parar aí. Temos sempre que estar criticando, e falar: "Como é que eu posso melhorar? O que tem de novo que eu posso colocar?". E com isso vamos gradativamente mudando os estágios. Entender, por exemplo, que temos os novos recursos, que recursos podemos usar além da imagem? Eu estou usando bem a imagem? Essa imagem que estou colocando aí fala alguma coisa? Está relacionada com o assunto, ou é simplesmente um enfeite que eu coloquei para ficar bonito e não tem informação nenhuma? Porque o leitor está procurando as informações. Se eu não falo qual a relação que tem entre o assunto que estou desenvolvendo e a imagem que eu coloquei, ele fica perdido. Porque ele pode ler a imagem do jeito que quiser. Então, esse processo de entender isso, os letramentos, como estamos falando, passa por esses estágios em que utilizamos da maneira que sabemos, mas gradativamente teremos que fazer esse movimento de ir avançando, e procurando outros estágios. Isso aconteceu com toda tecnologia. Se pensarmos no cinema, por exemplo, inicialmente era como o teatro. Era o teatro filmado. Mas logo eles começaram a perceber que podiam fazer mais. E hoje temos uma indústria do cinema que é totalmente diferente da indústria do teatro. Esse mesmo processo acontece com a tecnologia. Não sou contrário ao fato de o professor fazer as coisas como ele faz, e que são muito semelhantes ao que ele fazia antes, no lápis e no papel. O que é preciso é que ele dê um salto e não fique nesse estágio. Nesse sentido, os alunos podem ajudar muito, porque eles estão vivendo, numa rapidez muito grande, esse desenvolvimento tecnológico, e estão se apropriando de uma maneira muito mais rápida do que o professor. É importante fazermos parceria com o professor, notarmos a maneira como ele está usando a tecnologia, e aí incorporar isso nas nossas práticas. E, gradativamente, ir mudando nesses estágios, nesses processos de apropriação.
Salto – As tecnologias da comunicação e da informação fazem parte
do dia a dia dos alunos, sejam eles crianças ou jovens. Na grande maioria das
vezes, eles se conectam, usam a Internet para encontrar os amigos e para fazer
novos amigos. Eles estão na rede uma boa parte do seu tempo diário. Como é essa
relação entre os alunos e as tecnologias pode ser incorporada pelos professores
nas atividades escolares? Como o professor pode se apropriar dessa relação?
José Valente – É uma
relação muito dinâmica com a tecnologia. E, nesse sentido, vamos ter que
começar a pensar em outras maneiras de trabalharmos essas questões educacionais
em matéria de projetos e de atividades que os alunos estão fazendo, que não
devem estar restritos à sala de aula. Eu vejo, por exemplo, no curso que dou de
'midialogia', não necessito de 4 horas de aula, no sentido de que eu gostaria
de trabalhar com os meus alunos de modo que estabelecêssemos quais são as
atividades, quais são as tarefas, e eles saíssem para trabalhar e para fazer as
tarefas. Eles não precisavam ficar na sala de aula. Por quê? Porque esses
alunos estão conectados, esses alunos estão usando a tecnologia, de maneira que
é muito difícil falar: "Guarda a tecnologia e presta atenção, porque eu
vou passar a informação". Eles têm acesso à informação, tem acesso aos
colegas, têm acesso a praticamente tudo que pudermos imaginar em matéria de
recursos que possam formá-los, muito mais do que o que está no livro, muito
mais do que o professor sabe. O que precisamos fazer é usar essas tecnologias,
usar esses recursos para os alunos desenvolverem atividades, para os alunos
trabalharem. E esse trabalho não necessariamente acontece na sala de aula. Não
temos na sala de aula todos os recursos que o aluno precisa. Quando ele sai,
ele pode fotografar, ele pode filmar, pode buscar as informações que ele
precisa e trazer isso de uma maneira organizada, num projeto, e temos produto,
temos relatório, temos meios de verificar o que o aluno fez, acessar essa
informação, "corrigir", verificar como é que ele pode melhorar, e
assim por diante. Ficar restrito à sala de aula está ficando muito pobre. E
agora, como eu disse, com essa tecnologia móvel que estamos recebendo, o
Projeto UCA – um computador por aluno – onde cada aluno vai ter na sua mochila
essa tecnologia, vai ser muito difícil segurar esses alunos durante 4 / 5
horas, restritos numa sala de aula que não tem absolutamente nada. Tem a
carteira, giz, e quadro. O aluno vai ter que sair para fotografar vai ter que
sair para buscar pessoas, entrevistar, filmar, para trazer essas informações,
coordenadas num projeto, que tem começo, meio e fim, que tem produto, que tem
relatório, e assim por diante.
Salto – Você tocou numa questão que é importante: que esse
professor dê um salto, de um estágio em que ele estaria hoje, apenas
reproduzindo o que era feito no quadro de giz, usando as tecnologias, e você
aponta a necessidade de ele dar esse salto. Agora, como ele pode dar esse
salto, se ele ainda está nesse estágio de reprodução?
José Valente –
Sozinho, o professor não vai dar esse salto. Para dar o salto, é preciso de uma
ação educacional, no sentido de ter alguém, no sentido de ter formação, de modo
que seja possível criticar – no bom sentido – o que está sendo feito. É preciso
mostrar para o professor que existem outras maneiras de ele fazer essa
atividade, incrementando tanto o conteúdo, como o meio que ele usa para
representar esse conteúdo. Então, é formação. Na verdade, o que precisamos é de
uma formação continuada, porque essa tecnologia está num movimento acelerado de
desenvolvimento. E nós estamos sempre correndo atrás desse prejuízo. Dominamos
o PC – como conhecíamos – o desktop, e aí vêm outros recursos de web, por
exemplo. E nós falamos dos letramentos, da imagem, do som, coisa que não
podíamos usar antes, pois era muito pesado, era muito complicado usar som, usar
vídeo. Hoje essas coisas estão ficando mais fáceis. Então, esse professor
precisa: 1º - conhecer esses novos recursos que estão disponíveis; 2º -
entender como é que ele incorpora essas tecnologias no que ele está fazendo.
Nós estamos vivendo isso agora com o computador por aluno. Nós temos que
aprender como é que essa tecnologia pode ser usada, e aí praticamente
reproduzimos coisas que já fizemos antes, de colocar o computador em cima da carteira,
como se fosse um desktop, existem escolas que estão amarrando esse computador
para não ser roubado. Então, o que eles estão fazendo? Estão usando um
dispositivo móvel, como se fosse um desktop. Agora, eles começam a perceber que
o aluno pode usar isso em outro lugar, que ele pode levantar da carteira,
mostrar aquilo para o colega, pode sair no pátio, pode tirar uma fotografia, ou
seja, a própria tecnologia pode começar a mostrar essas coisas para ele. Porém,
se ele integrar isso ao currículo, para saber fazer essa integração, ele
precisa de alguém, do ponto de vista educacional, que esteja pensando essas
questões, para mostrar para esse sujeito, para esse professor, como ele pode
fazer essa integração. Se isso não acontecer, nós vamos ficar nessa banalidade,
achar que porque eu já estou usando o power point, porque já estou usando o
computador, estou fazendo uma grande coisa. Já não uso mais o giz e o quadro, o
power point substitui. Se o professor estiver num processo de formação
continuada, ele vai começar a interagir com outras pessoas, nessas comunidades,
por exemplo, e verificar que podem ser feitas outras coisas, de uma outra
maneira, que ele pode incrementar isso com o uso de outra tecnologia, com outro
conteúdo. E com isso ele vai progredindo nessas camadas, nesse processo de
apropriação. Sozinho ele não vai fazer isso. É muito difícil. Ele pode fazer
isso com os alunos, nessa parceria. Ou no processo de formação continuada, que
avança, que não começa sempre do estágio zero, como estamos vendo. Precisamos
fazer um processo de avanço. Outra coisa que está acontecendo: as pessoas estão
achando que uma vez que fizeram esse avanço inicial, que começaram a entrar no
mundo da tecnologia, fazendo parte de comunidades, por exemplo, vão resolver
seus problemas. O problema é que essa comunidade por si só não consegue dar
esse salto. Ela precisa ter alguém pesquisando, alguém que está preocupado com
o avanço, para que promova atividades na mudança desses estágios de que estamos
falando. Se não houver essas pessoas inseridas nessas comunidades, elas serão
como cegos conduzindo cegos. E ficam patinando, porque elas não vão conseguir
desenvolver esse próximo estágio. Essas comunidades, nesse processo de
formação, precisam de gente formada, pesquisando, incrementando, criticando o
que está sendo feito, de modo a conseguirmos dar os saltos que são necessários
nesses processos de apropriação.
Salto – Com a chegada dessas tecnologias ao universo escolar, o
que a escola pode ser capaz de promover hoje, e que possivelmente ela não
conseguiria antes?
José Valente – A
primeira coisa é o uso do laboratório. Esse uso de laboratório ainda é
controlado pelo professor, ele é que determina quando, onde e como vai ser
usado. À medida que esse laboratório vai se abrindo, ou que o professor vai
conhecendo outros meios de ele poder usar esse laboratório, por meio desses
processos de formação, vão-se criando mecanismos para incrementar o que
acontece na sala de aula, para que isso possa ser feito por intermédio das
tecnologias. Isso é um processo que precisa de formação. O professor precisa
estar nesse processo de formação, de modo que ele possa entender que esse
laboratório pode ser usado de outra maneira. Outra coisa que vai acontecer
também é a chegada dos computadores um a um, o Projeto UCA – um computador por
aluno. Isso vai fazer com que a dinâmica da sala de aula tenha que se alterar.
Vai ser impossível segurar esse aluno durante duas horas, com o computador
desligado na mochila, e aí o professor, num determinado momento diz: "Agora
é a hora de usar o computador. Tira o computador da sua mochila e vamos
usar". Acho que vai ser muito complicado fazer isso, muito difícil para o
professor controlar esse processo. Isso significa que vão ter que ser feitas
alterações na sala de aula, e o incremento, ou a conexão, e a vinculação dessas
atividades ao uso do computador, ao que se passa na sala de aula. Porque até
agora a sala de aula ficava como ela era antes: giz e quadro. E, de vez em
quando, vamos ao laboratório fazer uma atividade que pode não ter absolutamente
nenhuma relação com a atividade de sala de aula. Se o professor tivesse alguma
ideia diferente, ele poderia começar a fazer essa transição. Mas essa transição
acontece num outro momento, diferente daquela que acontecia na sala de aula.
Provavelmente o assunto já passou, porque a dinâmica da sala de aula é
diferente da dinâmica que acontece nos laboratórios. Então, era muito difícil
fazer essa integração. Eu acho, a minha grande esperança, é que com a chegada
desses computadores à sala de aula, o aluno tendo acesso a essa tecnologia,
essa dinâmica vai ficar muito diferente, e o professor vai começar a integrar
as atividades curriculares ao uso da tecnologia. Essa é a grande esperança, o
que esperamos que irá acontecer com a possibilidade do uso da tecnologia um a
um, ou um computador por aluno, como conhecemos.
Salto – Fala-se muito que estamos vivendo na era digital, a
cultura digital. Como seria uma escola que de fato estivesse em sintonia com
essa chamada cultura digital?
José Valente – Cultura
digital, para mim, significa que o aluno tenha acesso, que já incorporou essa
tecnologia digital ao seu dia a dia. Se eu tenho o meu celular, eu o uso do
jeito que eu quero, começo a gerar conteúdos, tiro uma fotografia, mando uma
mensagem, mando a foto, recebo a mensagem, recebo a foto. Ou seja, vivemos com
a tecnologia digital, porque essa tecnologia está incorporada ao dia a dia, à
maneira como o sujeito pensa e faz as atividades do dia a dia. Eu acho que a
escola vai ter que chegar nesse nível, de o aluno ter chance de poder usar
essas tecnologias móveis da maneira como ele acha mais adequado, dentro, claro,
de uma abordagem curricular que está sendo desenvolvida pelo professor, num
determinado conteúdo que está sendo tratado pelo professor, porém, a maneira
como o aluno vai usar, vai depender muito do que ele está fazendo, do projeto
que ele está fazendo. Por quê? Porque essa tecnologia obriga que ele passe a
ser autor. Ele é autor do seu projeto, da sua atividade. Ele não é mais receptor
das informações, mas ele passa a gerar informação. Para mim essa é a escola
digital. No sentido de o aluno estar gerando conteúdo, de ele ter acesso à
tecnologia à hora em que ele quer, no momento em que ele quer, quando ele
precisa, para desenvolver uma atividade que ele deseja, do jeito que ele
deseja. Claro que o papel do professor nesse processo vai ser diferente, por
quê? Porque ele não vai mais repassar o conteúdo, repassar a
informação, mas ele vai ser o sujeito que vai, de certa maneira, administrar o
uso que o aluno está fazendo, porque não pode fazer qualquer coisa. Tem um
projeto que está sendo desenvolvido, tem um projeto que tem que ser entregue,
tem um projeto que tem que ser elaborado, com relatórios, com produtos, e assim
por diante. Esse professor passa a ser o coordenador, o administrador de como o
aluno faz isso, de como ele produz, se ele produz, se ele produziu dentro dos
parâmetros que foram estabelecidos, do ponto de vista do uso de conteúdo, da
maneira como ele apresenta, de como ele usa a imagem, de como ele usa a palavra
escrita, de como ele usa sons, e assim por diante. Ou seja, o professor vai
fazer um contrato com os alunos, do ponto de vista de um projeto que tem que
ser desenvolvido, que trata de um determinado conteúdo, e esse aluno vai
trabalhar, não de maneira restrita à sala de aula, naquelas quatro horas, mas
ele vai trabalhar desenvolvendo esse projeto, que pode ser fora da sala de
aula. E aí ele traz para dentro da sala de aula esse produto que ele
desenvolveu, com relatório, e assim por diante, e esse professor vai verificar
se esse trabalho foi realizado de acordo com aquilo que tinha sido combinado,
ou se ele vai ter que refazer, porque determinados conteúdos não foram
tratados, determinados usos tecnológicos não foram feitos, as imagens estão
sendo mal utilizadas, o som foi mal utilizado, e assim por diante. Essa é a
escola digital. Essa é a escola da era digital. Isso significa fazer também
mudanças curriculares. É impossível você pensar esse aluno trabalhando com essa
abordagem, com esse mundo tecnológico, e pensarmos o currículo feito no lápis e
no papel, como ele é feito hoje. Isso significa mudança nessa abordagem
curricular, não significa mudança dos conteúdos. Não é a matemática que vai
mudar, não é a física, não é o português, é a maneira como esses conteúdos vão
ser tratados. Antigamente eles eram tratados só com lápis e papel, e hoje você
passa a tratar com outros letramentos (imagem, som), dinâmicas da era digital,
da web 2.0. Isso significa o currículo da era digital, e não o currículo da era
do lápis e do papel. Nós temos que sair da era do lápis e do papel, e passar
para a era digital. Do ponto de vista tanto da tecnologia como a usamos, como
das abordagens pedagógicas, e o currículo vai ter que sofrer essa transformação
de passar a ser o currículo da era digital.
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